UM AMIGO PRESO PELO
OUTRO AO DESCER DO AVIÃO
No capitulo 2 desta série o homem misterioso se apresenta e
destitui o governo, formando outro, o capitão engenheiro do Exército
Anachreonte Coury.
No dia 1º de abril Porto Velho literalmente amanheceu já
tomada pelos militares, os da 3ª Companhia de Fronteiras com apoio dos membros
da Guarda Territorial, em patrulhas mistas, em pontos estratégicos, mas apesar
da vida continuar e não haver manifestações contrárias ao novo regime,
instalou-se o medo e houve pessoas que preferiram se esconder.
O interventor Anacrheonte tomou a decisão de mandar prender
pessoas suspeitas, lideranças sindicais e estudantis e membros do governo e das
prefeituras, de Porto Velho e de Guajará-Mirim.
No dia 31 eu estava em
casa quando chegou um amigo que participava das reuniões comigo na casa do
jornalista Dionísio Xavier. O camarada chegou e me chamou de lado dizendo que
ele iria dar uma sumida e era bom eu fazer o mesmo para evitar ser preso, mas
eu disse a ele que não iria me esconder. Que se me quisessem prender que
viessem me buscar em casa, lembrou o professor Abnael Machado de Lima, que
acabou nem sendo perturbado pelo governo novo.
Mas houve prisões. Eles
em grande maioria chegavam sempre à noite, disse uma vez o dirigente
comunista Cloter Mota, quando era deputado na primeira legislatura da
Assembléia Legislativa. Ele foi um dos presos.
Um fato que chamou a atenção foram as prisões membros do
governo e da prefeitura, pessoas que tinham ligação com o Partido Social Progressista,
capitaneado nacionalmente pelo governador paulista Adhemar de Barros, que era
uma das lideranças civis na deposição do governo João Goulart.
Outro fato que acabou virando espécie de folclore foi que
enquanto os membros do governo e da
prefeitura foram levados para p quartel da Guarda Territorial, no bairro da
Arigolândia, onde atualmente funciona a sede do 1º Batalhão de Polícia Militar.
Ali as instalações
eram bem modestas, enquanto nós, que éramos apontados como comunistas, fomos
levados para a 3ª Cia., instalados no cassino dos oficiais, onde havia muito
mais conforto, disse ao projeto testemunha
da História o então líder estudantil João Lobo. Era como se nós fôssemos presos
de primeira categoria e eles de segunda.
Cloter Mota, que já como deputado estadual chegou a ser
preso numa reunião em São Paulo com um núcleo do Partido Comunista em 1985,
dizia que a qualidade da comida no
cassino da 3ª Companhia era melhor do que na casa de alguns presos e fomos bem
tratados.
Para o jornalista Euro Tourinho, em cuja sala de direção do
jornal Alto Madeira o capitão Anacrheonte reuniu com os novos dirigentes e
decidiu as primeiras prisões, o mundo
virou de cabeça para baixo.
UM AMIGO PRENDE O
OUTRO
Cidade pequena, onde praticamente todos se conheciam e conviviam
socialmente, um dos pontos de encontro e de trocas de informações eram as
bancas do mercado municipal (que em 1966 pegou fogo e foi reconstruído
parcialmente em 1909 agora com o título de Mercado
Cultural), as divisões aconteciam nos períodos da política, quando o
Território escolhia seu único deputado federal, nas disputas entre cutubas e peles curtas (*) ou nos jogos do campeonato de futebol.
E foi nesse quadro que o delegado Orlando Freire recebeu a
ordem de ir ao aeroporto e prender, na escada do avião da Panair (leia-se Paner), seu amigo, o ex-prefeito,
demitido por Anacrheonte, Jaime Rafael Castiel. Tenho certeza que deve ter sido difícil cumprir essa missão porque o
delegado era amigo pessoal do Rafael, recordou o professor Abnael Machado
de Lima.
Ele continuou: A
população sabia da chegada e muita gente foi recebê-lo, lotando o pequeno
saguão do aeroporto do Caiari, mas um contingente reforçado da Guarda
Territorial tomou posição porque havia citações de que o povo iria resgatar o
Rafael, o que acabou não acontecendo e ele já seguiu dali para o quartel da
Guarda, localizado a menos de 500 metros da pista de pouso.
Dentre outros, além do prefeito Jaime Rafael Castiel, foram presos
(**): os dirigentes comunistas Cloter Saldanha da Mota, Dionísio Xavier, o
dirigente estudantil João Lobo, além de Otávio Félix, o secretário da
prefeitura José Carmênio, o capitão Távora Buarque, o médico Rafael Vaz e
Silva, o engenheiro Harry Covas, o empresário Miguel Chaquian, o médico
Floriano Riva.
Alguns dos presos foram levados para julgamento perane um
tribunal formado na 8ª Região Militar, em Belém mas, conforme o historiador
Abnael Machado de Lima todos retornaram absolvidos ou não enquadrados.
O capital Anacrheonte Coury permaneceu no cargo a que
assomou por si mesmo durante pouco mais de três semanas, quando passou o
governo ao coronel José Manoel Lutz da Cunha Menezes. Depois Anacrheonte, que
mandava prender, desapareceu como chegou, sem que ninguém prestasse atenção.
Ele não consta da lista oficial de governadores do Território.
(*) – Cutubas –
Aliados do coronel Aluízio Pinheiro Ferreira. Peles-curtas aliados do
médico (em 1964 deputado federal) Renato Borralho de Medeiros.
(**) Acusado de corrupção o coronel Alvarenga Mafra,
governador do Território, foi preso no Rio de Janeiro e teve seus direitos
restabelecidos em 1980, com a patente de general-de-brigada, conforme o
historiador Francisco Matias, em Pioneiros.
1964 em RO – Amanhã
A POLÍTICA NAS TERRAS
DE RONDON
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